OLHOS DE GAZELA NO CASTELO ASSOMBRADO

OLHOS DE GAZELA NO CASTELO ASSOMBRADO

Autora: Victoria Magna

gazela

Olhos de gazela no castelo assombrado

SÉCULO XX

Rosa e Sabrina combinaram com Pablo e Seynor, passarem as férias no campo e escolheram uma região próxima à aldeia de Montserrat Duperrier, que fora fundada 700 anos antes pelo Conde Montserrat Duperrier. Na sétima geração, os herdeiros arrendaram o castelo e as terras para uma família, também nobre, mas que pouco iam lá... Somente um zelador e sua família cuidavam do prédio, alugando alguns aposentos para historiadores e turistas que iam visitar a região, que primava pela maravilha natural dos seus campos e vales, sempre floridos e arborizados por um verde sem igual.

Os quatro arrumaram as malas dentro do carro que os levou ao aeroporto de Paris, que ainda não era chamado Charles De Gaulle. Daí, viajaram de trem para um pequeno vilarejo, de poucas casas, onde, conversando com um mercador local, souberam que o Castelo Montserrat Duperrier era tido como assombrado. Ali se ouviam gritos, barulho de lutas de esgrima, e ruídos estranhos nas altas horas da noite.Isso espantou alguns turistas que lá se alojaram por apenas dois dias e uma noite. Desde então, ninguém mais freqüentou o lugar. O zelador dizia que nada havia de estranho, nunca vira nem ouvira qualquer som diferente no Castelo. Sua casa ficava um pouco afastada do Castelo, no centro de um pequeno jardim bem cuidado. Era uma vivenda de elegância simples, bem conservada, com grandes janelas de cristais trabalhados com desenhos de flores coloridas. No telhado havia uma clarabóia que clareava o ambiente interno,uma espécie de jardim de inverno. A esposa e os dois filhos do casal eram louros sorridentes e simpáticos. Não acreditavam nessas historias de fantasmas, que diziam ser tolices de gente da cidade que tem medo de tudo.

Os jovens se despediram e alugaram um cabriolé dirigido por um aldeão muito calado, que só respondia o que lhe perguntavam com certa reserva.Os dois casais estavam eufóricos pela aventura. Senyor trabalhava numa gazeta mercantil e Pablo, que era fotógrafo da mesma, namorava Sabrina, ítalo-francesa e Rosa era colega de Seynor na redação da Gazeta. Mas eles tinham a ambição de tornarem-se verdadeiros repórteres à cata de algo fora do comum para fazerem jus a uma classificação no jornal " Le Champion", que estava selecionando repórteres e fotógrafos para a sua equipe.

O cabriolé parou à frente de uma pequena hospedaria de nome Le Monstre de Montserrat Duperry (havia uma disputa entre as famílias Duperrier e Duperry mas, no final, eram todos parentes). A hospedaria era uma casa tosca, mal conservada por fora, cujo aspecto não combinava com a beleza do lugar. Mas os jovens acharam melhor descansarem e comerem alguma coisa.

A hospedaria não era bonita, nem moderna, mas era limpa, bem varrida, com móveis rústicos antigos... e havia um aroma de rosas no ar...Um buquê de rosas amarelas e brancas faziam um par perfeito com o verde escuro das folhagens ao redor.. Eles entraram, cumprimentaram o hospedeiro e tomaram dois quartos para si. Rosa e Sabrina ficaram no quarto da frente, com um alpendre de frente para o caminho e Pablo e Seynor nos fundos. Eles não eram tolos e escolheram assim, estrategicamente. Acontecesse uma surpresa em algum canto da casa, logo saberiam e avisariam uns aos outros. Pablo logo fotografaria as novidades imprevistas. De onde estavam, dava para ver as altas torres do Castelo, ao longe, uns dois quilômetros do pequeno povoado. Já anoitecia e resolveram dormir para irem bem cedo visitar o Castelo.

Manhã bem cedo,os jovens fizeram o desjejum de pão com leite e mel e um pedaço de queijo. Na hospedaria o café era raro. Uma vez ao dia, serviam uma pequena xícara para os poucos hóspedes que ali se instalavam para seguirem viagem. Foram à pé até o Castelo. A construção antiga, datando de mais de uns 500 anos, foi construída para o Conde Leonard Duperrier de Montserrat, que deu o seu nome a esta que foi a sua primeira moradia,quando voltou da guerra das Cruzadas, recebido pelos aldeões como herói. O Rei, na época, lhe presenteara com esta moradia majestosa, atualmente arruinada em sua maior parte. Pouco restou do luxo de outrora. Ainda se nota os móveis rusticos trabalhados com desenhos de brasões e alguns móveis da Renascença, artisticamente confeccionados por mãos de exímios carpinteiros. Cristais antigos restaram poucos, mas, dos tapetes, já poluídos pelo uso, trocados a cada geração, só restou um da época das Cruzadas. Enorme, com florões vermelhos e folhagem verdes com botões de rosa distribuídos ao redor de toda a orla do tapete. Obra magnífica, traduzindo o bom gosto e a riqueza da família Duperrier de Montserrat. Os jovens pediram permissão para fotografar os salões, onde há 500 anos eram realizados grandes bailes da corte.

O Conde Leonard Duperrier de Montserrat tinha dois filhos, gêmeos, quase iguais. Não se poderia dizer que um era Eleonard e o outro era ou não Dranoele. Vestiam-se igualmente com casacos nas cores azuis,brancas e vermelhas . Seus cabelos doirados e olhos azuis intensos atraiam as mulheres e donzelas da povoação e as cortesãs que não deixavam por menos.

Um dia, Dranoele se apaixonou por uma das damas da Rainha, cujos grandes olhos vivos e brilhantes, mais pareciam os olhos de uma gazela do bosque onde iam caçar nos fins de semana, quando não praticavam a arte da esgrima no pátio do Castelo. Grandes quadros, pintados a óleo em cores vivas, mostravam os irmãos nos seu uniformes de montaria sobre cavalos árabes garbosos em meio a um grupo de caçadores, também uniformizados. Outro grande quadro chamava a atenção sobre um baile da corte, onde, entre a fidalguia toda, sobressaia a imagem de Thereza D´Ancourt, a jovem dos olhos de gazela, sorrindo e oferecendo uma taça de vinho a um cavalheiro, graciosamente vestida com roupas de seda, vermelha com uma sobressaia sobreposta em azul e branca e bordada com filhoses a fio de ouro. Esse quadro era o preferido de Dranoele. Várias vezes o viram parado diante do quadro, a cismar...

Pablo fotografou tudo, até o teto do salão,ricamente trabalhado com pintura feita pelos artistas famosos da França e Itália..Rosa chamou a atenção para o tapete, cuja mancha escura não combinava com o desenho e as cores ainda bem conservadas, apesar dos anos seculares... Pablo fotografou as manchas...Seynor interessava-se mais pelos aspectos históricos e artísticos. Pediu ao zelador para ver os aposentos do primeiro andar. O zelador consentiu, apenas, a visitarem os quartos de hóspedes. Todos os outros aposentos estavam hermeticamente fechados.

SÉCULO XV

Realizava-se um grande baile na Corte no Castelo Duperrier de Montserrat, num dia primaveril em que, cheios de alegria, os convidados elegantemente vestidos, se apresentaram, aos pares, com suas famílias, as moçoilas casadoiras, parentes e amigos, entre os quais a bela Olhos de Gazela, como a chamavam Eleonard e Dranoele.

Este logo se apresentou à moça, fazendo a reverência de costume, esta lhe ofereceu a mão e ambos foram para o salão dançar na roda já formada pelas damas e cavalheiros fidalgos.

Eleonard os observava de longe. Ao final do baile foi encontrar com o irmão e Thereza, a qual lhe despertara profundo sentimento. Os três conversaram muito, Thereza ria, divertida com o interesse dos gêmeos.

Seus pais estavam satisfeitos vendo a filha na companhia de fabulosos herdeiros. Eles desejavam que a filha se casasse com um dos dois, os jovens mais cobiçados da corte.

Mas o destino dá suas voltas, vai e vem...

Foi num certo dia, em que Thereza se encontrara com Eleonard e este lhe fizera a corte, elogiando-a por sua beleza e seus olhos de gazela. Thereza gentilmente tentou desconversar, mas Eleonard a segurou pelo braço e lhe fez uma declaração de amor. Nesse instante, apareceu Dranoele e... enciumado, avançou até eles, com ímpeto. Chamou Thereza e esta, encabulada, procurou sorrir e despedindo-se de Eleonard, acompanhou Dranoele até a varanda do parque arborizado. Eleonard, ainda mais louco de ciúmes, se conteve para não brigar com o irmão, diante dos serviçais que presenciavam tudo.

SÉCULO XX

Seynor voltou ao salão e convenceu os amigos a se hospedarem no Castelo. Pablo se ofereceu para ir buscar as bagagens na hospedaria Enquanto isso, Rosa e Sabrina observavam as pinturas e decorações de outros salões e gabinetes que eram divididos por extensos corredores ainda no estilo do Século XV como os antigos aparadores de archotes, ainda presos às paredes de pedra bruta, porém limadas. Portões com correntes fechadas por cadeados cercavam uma espécie de pia batismal. Tudo parecia desabitado há séculos. Voltando para o salão, lá encontraram Pablo com as bagagens, Seynor e o zelador. Este os convidou para subirem ao primeiro andar por uma escadaria de mármore,iluminada por castiçais, já com luz elétrica, ao lado dos antigos ainda portando velas gastas pela metade.

Anoitecia. O zelador pediu a um criado para servirem uma sopa aos hóspedes, pois a noite estava ficando muito fria, já no final do inverno.

Como fizeram na hospedaria, os jovens se dividiram em dois grandes aposentos, ainda com certo luxo, com lustres de cristais e cortinas de veludo e rendas finas. Os rapazes ficaram no quarto ao lado do das moças, onde havia uma porta que dava passagem para os dois aposentos. Isso foi de grande valia, pois Sabrina não conseguiu dormir e, ao levantar-se para beber água em um jarro sobre a mesinha, no meio do quarto, viu uma figura de mulher toda de branco, que a chamava angustiada,dizendo uma palavra parecida com "estojo", estojo, estojo...Sabrina não pôde ver seu rosto, parecia haver duas manchas escuras no rosto emoldurando por um véu.... Assustada, chamou Rosa, que dormia. Esta, aborrecida, levantou-se também e Sabrina contou-lhe o que viu. Resolveram chamar os rapazes, batendo na porta divisória. Mas estes dormiam profundamente...

Rosa e Sabrina resolveram voltar para seus aposentos e discutir o caso no dia seguinte.

SÉCULO XV

O Castelo, nesse dia, estava silencioso, nuvens negras previam grande temporal. E assim, tinham que preparar os archotes e os candelabros, como faziam há anos, pois não haveria luar nessa noite.

As duas famílias nobre que lá se hospedavam, eram os os Duperry de Montserrat, meio parentes, e os D´Ancourt´s da qual pertencia Thereza, Olhos de Gazela, que se fizera noiva de Dranoele. Nessa noite fariam uma reunião para selar o compromisso formal. Eleonaard se mantinha afastado todo o tempo, nas caçadas, nas lutas de esgrima, nas tabernas do povoado. Às vezes bebia demais.

Essa noite chegou meio tonto, carregado por dois serviçais, um pajem que sempre o acompanhava à cavalo pelas redondezas. O Conde não gostou muito disso e pediu desculpas aos presentes.Thereza, com o rosto preocupado, subiu ao quarto e escreveu uma carta endereçada a um seu irmão, na cidade. Nela dizia de sua preocupação com os irmãos Duperrier, lastimava que tinha dado esperanças a um e outro e agora temia uma indisposição entre os dois. Entregou a carta a uma mucama para levar ao mensageiro do povoado, logo que se fizesse dia. Voltou e conversou com Dranoele pedindo desculpas para dormir mais cedo, estava cansada e com dor de cabeça.O noivo gentilmente acedeu e ela subiu para seus aposentos.

Acabada a reunião, todos se retiraram para seus aposentos. Altas horas da noite, ouviram gritos de terror! Vinha da torre do castelo.Assustados, todos correram para a escadaria que levava às torres, mas os portões estavam fechados por dentro. Alguém se trancara na torre.

Um homem encapuzado levara Thereza amarrada a uma das torres, tapara-lhe a boca com uma de suas vestes e com um punhal afiado, arrancara-lhe os dois lindos olhos de gazela. Thereza queria gritar, mas a voz não saía, de seu belo rosto corria lágrimas de sangue. O golpe final foi quando o monstro lhe rasgara o peito de cima abaixo, e com uma fúria total a jogara no fosso abaixo dos muros do Castelo. Antes de jogar a moça no fosso, teve o cuidado de untar os olhos arrancados com um líquido próprio para conservação e o colocara num estojo de veludo e este dentro de uma redoma de vidro. O estojo guardou-o depois em uma grande armário num dos aposentos que tinha uma porta secreta.

Na manhã seguinte, ainda preocupadas, as famílias sentiram falta da jovem. Procuraram por toda a parte...Mas só encontraram as roupas da infeliz no meio das águas do fosso que cercava o Castelo. Seu corpo tinha desaparecido.

Desesperado, Dranoele, quase louco, saiu armado de sua espada à procura do raptor, se é que existia. Pois ninguém soube como acontecera a noite dos gritos e o silêncio profundo logo a seguir...

Uma tarde, Dranoele, ainda abatido pela ausência de Thereza (ele ainda não acreditava em sua morte), abrindo a gaveta de sua escrivaninha, encontrou a carta de Thereza ao irmão. Ficou intrigado, com suspeitas, foi procurar o irmão Eleonard... Interrogou-o, queria saber tudo que se passou entre ele e sua bela noiva. Eleonard tudo negou, mas Dranoele não se convenceu. Queria tirar tudo a limpo. Então entraram no salão de festas, mas quando um deles ia subir as escadas, o outro agarrou-o e desafiou-o ali mesmo. E os dois entram em luta, eram ótimos espadachins, lutavam igualmente com perfeição, na graça, nos movimentos e nos ataques. Mas houve uma hora que um dos dois tropeçou e teve a espada enterrada em seu peito Com esforço tentou revidar e ainda com vida desfechou golpe mortal da mesma forma no seu irmão de sangue. Atônitos, os serviçais e algumas mulheres tentaram socorrê-los, mas foi em vão. Jaziam mortos os dois lindos jovens personagens de uma grande tragédia no Castelo Duperrier de Montserrat. Nunca se soube realmente quem teria perpectrado tamanho infortúnio. Uns diziam que era um dos dois que sumiram com a jovem Olhos de Gazela, e que o Amor, a Paixão e a Traição ali estivera disfarçados no coração de um dos gêmeos.

SÉCULO XX

Rosa e Sabrina ouviram esta estranha história de um antigo serviçal já aposentado, que explicara aos jovens a razão das aparições e ruídos estranhos no Castelo. A carta anda existe. Era uma prova para a reportagem que os jovens desejavam fazer. Na outra noite, Sabrina ouviu uns gemidos, barulho luta de espadas, no salão. Chamou os outros para ir até lá ver... Desceram as escadarias de mármore até o salão, mas não ouviram novos ruídos. Sabrina, a mais sensível dos quatro,ao olhar para a figura de Thereza, no quadro do Baile da Corte, viu-a se transformando em uma mulher toda de branco, e o rosto parecia ter dois buracos escuros em lugar dos olhos. E ouviu distintamente: O Estojo, O Estojo...O...E..s..t..o..j..o.

Contou para os outros e disse:

- Temos que procurar o Estojo, deve estar aqui em algum lugar.

Sem que o zelador soubesse, remexeram tudo, destrancaram portas, portões, gavetas e até o sacrário.... então,foi aí, que acharam o Estojo, dentro do qual viram dois olhos brilhantes, ainda vivos a fixarem neles com gratidão!

Foi uma das maiores reportagens que fizeram...

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