FOBIA DE INSETOS

FOBIA DE INSETOS

Autor: RODRIGO MORENO



FOBIA DE INSETOS


Rodrigo Moreno


Augusto acordou em sua cama. Olhou a hora no relógio. 3:00 horas da madrugada. Estava sem sono, cansado e com um pouco de dor de cabeça. Foi até a cozinha e bebeu um copo d’água. Lavou o rosto no banheiro, voltou para cama e esperou o sono voltar.


Começou a pensar no pesadelo que acabara de ter. Via a cidade infestada de enormes insetos. Ele sentia um calafrio pelo corpo só de pensar nisso. Ele tinha fobia a insetos, descartando somente formigas pequenas. Esses pesadelos têm sido constantes ultimamente. Talvez, seja pelos problemas que estava passando em sua vida social. Outrora, levava uma boa vida, tinha um bom emprego e estava destacando-se na faculdade de medicina. Mas hoje, sua vida caiu nas garras da decadência. Foi despedido do banco onde trabalhava, seu pai morreu de enfarto a poucos meses e suas notas na faculdade caíram muito, fora que suas mensalidades estão três meses atrasadas. Com esses motivos, Augusto foi perdendo a vontade de viver. O sono voltara gradualmente enfraquecendo seu corpo e sua mente à medida que seus olhos pesavam. Ele cedeu com prazer.


Encontrava-se vagando pelas ruas no pôr-do-sol. Estava indo se encontrar com Vanessa, sua namorada, na praça. Ele a viu de costas e olhou as horas. Estava uma hora atrasado. “Ela deve estar furiosa!”, pensou ele. Mesmo assim, aproximou-se pesando em uma nova desculpa.


- Oi - disse ele, tentando esconder a vergonha. Vanessa continuava de costas com os braços cruzados. – tá bom...sei que me atrasei de novo.


Ela continuava na mesma posição ignorando-o.


- Ora vamos... - insistiu – fale comigo!


Ela se virou para trás. Seu rosto era bonito e jovial, entretanto a expressão de horror projetada no rosto de Augusto, revelava que o que via não poderia ser sua namorada e que tudo só poderia ser uma grande piada criada nas profundezas do inferno. Vanessa, dona de uma beleza sutil, mas que às vezes chamava atenção, agora exibia um rosto aracnídeo de uma profana cria de Satã com olhos vermelhos cor-de-sangue afundados na face medonha e escura com presas intimidadoras. Augusto acordou gritando. Estava novamente em seu quarto e, ainda desperto, sentia minúsculas patinhas correndo pelo seu corpo fazendo seus pêlos se arrepiarem. Não foi preciso olhar completamente o corpo para ver o que estava acontecendo. Quando sentiu que essas patinhas passeavam pelo seu queixo percebeu que o corpo todo estava infestado dos mais variados tipos de insetos. Gritou novamente pulando da cama. Acabou derrubando alguns, o que era inútil visto que eram milhares, de todos os tipos e muitos o machucam com seus ferrões.


Augusto continuou derrubando-os com suas mãos. Mas eles pareciam que nunca acabavam, como se nascessem outros instantaneamente. Alguns entravam em sua boca e ele os cospia fora. Conseguiu vomitar os que estavam descendo a garganta. Seu coração batia aceleradamente e ele achava que poderia ter um enfarto. Gritou por socorro, inutilmente. Correu para a cozinha, pegou o inseticida e passou rapidamente por todo o corpo. O que também foi mais uma atitude inútil. O inseticida acabou e nenhum inseto morreu. Correu para o banheiro e ligou o chuveiro. Ficou debaixo dele tentando lavar o corpo. Quanto mais insetos caiam, mais apareciam.


Ele não aquentava mais essa agonia. Esses monstrinhos estavam em todo o seu corpo, desde os cabelos e a boca, até os pés e entrando em seu ânus. Ele enojava o próprio corpo e se pudesse mudaria de pele, pois para ele nem todos os tipos de banho tirariam tal “sujeira”. “Já deveria estar rouco de tanto gritar”, pensou ele enquanto baratas tentavam entrar em sua boca. Talvez sua garganta seja mais resistente do que aparenta. Mas isso no momento não era o mais importante. Esse era, sem dúvida, o pior momento de sua vida e ele rezava para que não fosse real. Talvez sua fobia tivesse chegado a um estado muito avançado que agora estava tendo alucinações. Ou melhor, talvez aquilo fosse apenas um pesadelo. Mas não podia ser real.


Bateu três vezes com sua cabeça na parede na esperança de acordar. Nada aconteceu. Correu para a cozinha, pegou uma faca e fez um corte na palma de sua mão esquerda. A dor era tão grande que por um momento esqueceu seu sofrimento. O sangue escorria pelo seu braço sujando alguns insetos. Mas, novamente, ele continuava em seu insuportável pesadelo. Percebeu então, que não estava sonhando. Além disso, estava começando a perder a hipótese de ser apenas uma alucinação. Decidiu então ligar para Vanessa.


O telefone não funcionava.“Essa merda deve tá quebrada!”,pensou ele.“Talvez seja até melhor ela não me ver assim!”.


“Acho que é o fim!”, pensou ele sentando no sofá enquanto os insetos cobriam seu corpo. Já não sentia tantas dores e nem se preocupava com o que fosse acontecer. Apenas tentava manter a boca fechada para não engolir algum inseto.J á havia perdido a vontade de viver. Mal conseguia ouvir seus pensamentos com o barulho agudo e bestial causado pelos insetos que corriam por sua cabeça. Só lhe restava uma coisa a fazer: esperar a morte chegar. Era algo inevitável e por isso não adiantaria nada ficar apavorado. Já estava até começando a se acostumar com a agonia.


“Talvez seja melhor morrer”, pensou ele. Não tinha nada nesse mundo que o interessava, exceto Vanessa. Mas ele já não a amava tanto e seria melhor ela procurar alguém mais interessante, com um bom futuro e não um cara na beira da decadência. Foi até a gaveta do armário e pegou seu revólver. Abriu bem sua boca e enfiou o cano frio da arma. Sua mão tremia bastante enquanto ele segurava a arma que no momento parecia ser a única saída daquela agonia infernal. Os insetos continuavam a violentar seu corpo. Ele pensou uma última vez em Vanessa e apertou o gatilho.


Algumas horas depois acordou. Seu pesadelo não mudara. Os insetos ainda atacavam seu corpo e ele continuava em seu apartamento. O chão estava sujo de sangue e sua cabeça também. Mas o buraco da bala desapareceu. “Merda! Eu devia tá morto!”, pensou ele. “Mas que droga tá acontecendo!?”, gritou. Correu para a sala. Tentou abrir a janela. Apesar de não sentir muito a dor causada pelos insetos, a agonia era cada vez maior e já que não conseguiu se matar com arma, talvez pulando da janela seria o suficiente. Entretanto, para piorar sua angustia emocional ela não abria.


Dava muitos socos fortes, mas a janela continuava não cedendo. Pegou uma cadeira e, com toda sua força, bateu contra a janela. Finalmente ela cedeu e ele podia ver a cidade. Mas tudo parecia diferente, vazio. Não tinha carros circulando nas ruas, o céu estava roxo e as trevas tomavam conta de prédios e casas. Sentiu-se só no mundo. Começou a ouvir barulhos graves de pisadas titânicas. Sombras que se moviam eram refletidas nos prédios e ruas. Gritos bestiais agudos e ensurdecedores que vinham de longe, mas que facilmente poderiam ser ouvidos por todas as ruas, quebraram o silêncio melancólico produzido pela solidão da cidade. Insetos com altura superior que o maior edifício que Augusto poderia ver dali surgia assumindo a autoria dos gritos e das sombras que cobriam prédios. Augusto afastou-se da janela sem fôlego para gritar mais. Respirava rapidamente para repor todo o ar que lhe faltara. Tentou se suicidar de várias formas. Todas se mostraram inúteis.


Ajoelhou chorando e começou a gritar desesperadamente “O que está acontecendo!”. Ao dizer isso, imagens começaram a surgir em sua mente. Ele se via jogado na cama com uma um lençol dando um nó em seu pescoço. Vanessa estava do lado da cama chorando com as mãos no rosto. Em seguida via-se dentro de um caixão e um padre com a bíblia aberta em suas mãos declamava os ritos de seu velório. Parentes e amigos estavam ao seu redor chorando e alguns também rezando. Seus irmãos consolando sua mãe e Vanessa sendo consolada por seu pai e seu irmão. Em seguida via-se nu dentro de um enorme útero. Sentia a dor de seus pecados e uma luz mórbida o puxava para fora.


Todas essas imagens lhe atingiam como flechas venenosas ou como notícias amargas e ainda mais angustiantes que os insetos. Lembrava-se de tudo, desde da dor que sentiu ao ver seu pai no caixão até a dor do lençol esmagando seu pescoço. Ele só queria escapar do sofrimento, mas, agora sua alma estava condenada a viver para sempre em seu mundo de agonia particular, onde seus piores pesadelos tornaram-se reais!



“Quando o perigo cresce a ponto de a morte se tornar esperança, o desespero é o desesperar de nem sequer poder morrer.”

Sören Kierkegaard, O Desespero Humano.


FIM

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