O PODER DA SÍFILIS
Autor: Paulo Soriano
Ninguém sabia – e mesmo poderia imaginar –, mas o homem que se sentara numa das mesas mais chiques daquele restaurante caro era um vampiro.
Pediu um vinho tinto encorpado – daqueles cuja viscosidade mais lembrava a textura do sangue – e se serviu de pequenos goles. Lançou um olhar no entorno, mas o que viu pouco lhe agradou. Então esperou.
Mas não aguardou por muito tempo. À frente de sua mesa postou-se uma mulher de uma beleza quase gótica. Pequenos vaporosos olhos azuis. Palidez. Longo pescoço. Sedução. Cabelos de víboras que se contorcem prazerosamente. Uma mulher ideal.
O homem, que era um vampiro verdadeiro, não tomou conhecimento do companheiro da mulher. Mergulhou-lhe as longas unhas na jugular, que se rompeu docilmente. O sangue brotou numa torrente, e a cabeça do homem tombou para trás, como resultado do empuxo. Depois o vampiro avançou para a mulher, arrebatou com força o colar de diamantes que lhe cingia o pescoço de cisne, e nele cravou os caninos. Depois sugou demoradamente.
As pessoas ao redor nada esperaram. Fugiram todas. Certamente duas ou três foram pisoteadas.
Terminado o assédio, o vampiro abriu a carteira. Com a ponta dos dedos, onde as unhas retráteis já se haviam acomodado convenientemente, sacou duas notas de grande valor, colocando-as em seguida sobre a mesa. Então afundou as unhas, que voltaram a crescer assustadoramente, num dos olhos da mulher, retirando-o da órbita com graciosa destreza. Inclinado a cabeça, num gesto elegante, levou-o à boca e mastigou prazerosamente. Depois, comeu o outro olho, como se fora um pêssego macio.
Estalou os lábios. Vendo que o homem ainda sangrava, colheu o esguicho numa pequena taça de vinho e entornou o sangue rapidamente, à maneira dos cowboys.
Arrotou. Limpou a boca com as costas da mão. Estava satisfeito. Então viu o mundo girar. As mesas rodopiavam em torno de si como um carrossel alucinado. Ah! Como fora descuidado! Num ambiente rico daqueles não poderia haver riscos, mas, ainda assim, havia! Uma prostituta de luxo! Uma prostituta sifilítica!
O vampiro tombou. O vírus da sífilis invadira o seu cérebro e lá pregava a sua pequena peça. Uma pecinha escrota e fatal. Estacas no coração? Uma lenda! A luz do Sol? Outra lenda ainda mais absurda. Mas a sífilis... A sífilis era o cianeto dos vampiros. Letal. O poder mais destrutível da terrível doença. Coisa que só os mais experientes dos vampiros – como aquele, que agora engorgitava coágulos e morria – poderiam saber.
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